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#04 | 07 de Maio 2007
         
 



Rui Grilo
“Não há instrumento analítico mais poderoso do que a capacidade de reflexão”

 

Uma cultura de objectivos e resultados é a base de uma gestão eficaz?
Muitos gestores dirão que sim, que é através da fixação de objectivos e da medição dos resultados que as intenções da gestão de topo se traduzem em acções de toda uma organização. Eu penso que a preocupação com os objectivos e os resultados é natural, pois faz parte da experiência de qualquer gestor, mas é preciso ver para além da superfície. Aquilo a que se chama ‘cultura de objectivos e resultados’, muito popular no discurso dominante na gestão, é traduzida na vida concreta das organizações através de uma série de instrumentos e técnicas de gestão cujo objectivo é definir acções, controlar a sua execução e avaliar os seus resultados. Se os gestores não estiverem atentos, essas técnicas de controlo podem produzir padrões de relacionamento que degeneram numa cultura conservadora, avessa aos riscos e à inovação e cujo horizonte não vai além da próxima demonstração de resultados. A sustentabilidade da organização para além desse horizonte é essencial para uma gestão eficaz e, para isso, é preciso encontrar um equilíbrio entre os resultados imediatos, que libertam recursos, e a capacidade de assumir riscos e inovar para gerar o valor futuro.

O estado futuro de um sistema adaptativo complexo pode ser previsto, antecipado ou controlado?
Não pode. Esse é um dos aspectos mais inovadores das ciências da complexidade, a noção de que existem fenómenos cujo comportamento não pode ser previsto, antecipado nem controlado, mas nos quais se podem observar padrões dinâmicos de comportamento com alguma estabilidade, alguma ordem. Um sistema adaptativo complexo é composto por um conjunto de agentes, com regras e objectivos próprios, que interagem entre si. Quando se observa que a ordem pode emergir num sistema desses, isso demonstra que a “ordem” não resulta apenas da intenção e do controlo. A “ordem” pode surgir simplesmente como um padrão emergente.

Como é que sistemas não regulados podem produzir ordem através simplesmente da interacção entre os agentes que o compõem?
Isso foi uma surpresa para os próprios investigadores que identificaram esse comportamento. A ordem emerge da interacção pela interdependência entre esses agentes. Cada um, ao decidir com base nos seus objectivos próprios, acaba por contribuir para o padrão de interacção que emerge do conjunto das interacções e dos objectivos. Admitir que a ordem pode emergir de forma imprevisível coloca em causa o paradigma científico dominante, que sugere que se não se consegue prever alguma coisa é porque não se estudou o suficiente…

Qual é a crise do paradigma científico dominante?
O nosso conhecimento científico desenvolveu-se desde o Renascimento procurando relações directas entre causas e efeitos, atingindo um sucesso suficientemente grande para nos proporcionar o conforto de que gozamos actualmente no mundo desenvolvido. Esse sucesso pareceu prometer, como Pierre Laplace expressou no início do século XIX, que seria possível encontrar uma fórmula tal que seria capaz de prever os movimentos de todos os corpos do Universo, dos maiores planetas até ao menor dos átomos, eliminando assim toda a incerteza. Mas foi a própria evolução da ciência que destruiu esse sonho, ao demonstrar que há muitos fenómenos no nosso mundo que escapam a esta relação linear entre causas e efeitos. Nesses fenómenos é impossível eliminar a incerteza. Isso foi demonstrado, por exemplo, pelo Princípio da Incerteza de Heisenberg, pelo Teorema da Incompletude de Gödel ou pelas Ciências da Complexidade. Não deixa de ser irónico que a gestão, tal como as outras ciências sociais, continue a procurar o sonho de um conhecimento objectivo e determinista quando a enorme interdependência entre as pessoas que constituem organizações e empresas tornam esses grupos de pessoas, por definição, cada vez mais difíceis de prever e controlar. Os gestores precisam de encontrar alternativas ao discurso dominante da gestão!

Que novas fontes de conhecimento exigem as alternativas ao discurso dominante na gestão?
É preciso cautela quando se procuram bases para discursos alternativos. As ciências da complexidade podem oferecer analogias interessantes para compreender o que se passa numa empresa, mas é errado dizer que uma empresa é um “sistema adaptativo complexo” (pode ter comportamentos análogos, mas um grupo de pessoas é qualitativamente diferente) ou sugerir que as equipas se devem “auto-organizar”. Não há fonte de conhecimento mais importante para um gestor do que a sua própria experiência e não há instrumento analítico mais poderoso do que a sua capacidade de reflexão. Gerir hoje em dia é cada vez mais ter a coragem para continuar a agir, apesar da ansiedade provocada por aquilo que não se conhece e que não se consegue controlar.

Biografia
Doutorado em mudança organizacional pela Universidade de Hertfordshire e graduate member do Complexity and Management Centre. É actualmente Coordenador Adjunto do Plano Tecnológico, depois de ter desempenhado nos últimos anos as funções de director do portal SAPO, coordenador de projectos web na direcção de comunicação corporativa do Grupo PT e analista sénior na direcção de desenvolvimento de negócios da mesma empresa. Desde Março de 2006, é também colaborador permanente do painel quinzenal Discutir a Gestão no Diário Económico.
Depois de concluir a sua licenciatura em Gestão de Empresas na Universidade de Évora, desempenhou várias funções na esfera pública, tendo sido adjunto do Secretário de Estado da Juventude António José Seguro, adjunto para os assuntos da educação do Primeiro Ministro António Guterres e chefe de gabinete do Ministro da Presidência e das Finanças Guilherme d’Oliveira Martins.
Tem 32 anos de idade e é o pai orgulhoso de uma filha com um ano.

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