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#14 | 17 de Dezembro 2007
 
     
 



Isabel Medalho Pereira
“Existem alteracões climáticas que já não se podem evitar”

 

Quais as causas que levam às alterações climáticas?
Ao longo da história a terra tem tido oscilações de clima, muitas das quais derivadas por forças naturais (variações de órbita, efeitos solares, actividade vulcanica, …). Porém, as alterações climáticas que estamos actualmente a debater são demasiado fortes e demasiado rápidas para serem explicadas por forças naturais. Um dos aspectos mais evidentes de alteração climatica é o aumento da temperatura global, ou “aquecimento global”: calcula-se que o último meio século foi o periodo de 50 anos com mais altas temperaturas nos últimos 1300 anos. O mundo está próximo do nivel de mais altas temperaturas que se conhecem durante a corrente era inter-glacial e que começou há cerca de 12 000 anos atrás.
A principal causa para o aquecimento global reside num aumento exponencial de emissões de gases com efeito de estufa, principalmente de dioxido de carbono. Estudos científicos (e.g., relatório IPCC, 2007) concluem que existem fortes evidencias de que este aumento de emissões se deve sobretudo a actividades humanas. Desde a revolução industrial (meados século XIX), actividades como a combustão de combustiveis fósseis (e.g., carvão, petróleo) e a alteração do uso dos solos, tem contribuido para que que a concentração média de dioxido de carbono esteja actualmente em 379 ppm (partes por milhao) e continue a aumentar a um ritmo anual de 1.9 ppm. Algo particularmente preocupante, se tivermos em conta que nos 8000 anos antes da industrialização a concentração de dioxido de carbono aumentou apenas em 20ppm.
A preocupação maior reside no facto de que o aumento de temperatura não vem isoladamente, mas associado com alterações ao nivel de todos os ecosistemas terrestres, sistemas hidrológicos, instabilidade de zonas glaciares… com consequencias para a vida humana, nas suas mais diversas vertentes: saúde, economia, estabilidade política e social, ...

O panorama negro que é traçado neste cenário é evitável?
Devido à inércia dos sistemas climáticos, ainda que mudemos desde já a trajectória de emissões, apenas após 2030 (e talvez só mesmo a partir da segunda metade do século XXI) se poderão ver os resultados. Ou seja, existem alteracões climáticas que já não se podem evitar. Para isso é importante preparar populações, capacitá-las para fazer face a riscos climáticos, minimizando as consequencias que terão nas suas vidas. Ou seja, é importante desenvolver e reforçar politicas de Adaptação às alterações climáticas.
Porém, a dimensão das alterações que se verificarão depende da forma como alterarmos desde já os nossos comportamentos. Se continuarmos a trajectória actual de emissões, com pelo menos 80% de probabilidade em meados do século XXI podemos estar já com aumentos de temperatura acima de 2C em comparação com a média de temperatura no periodo pre-industrial (o nível a partir do qual se considera que o risco de alterações catastróficas aumenta significativamente). Para evitar ultrapassar esse limite de 2C, é então crucial que desde já se altere a trajectória de emissões de gases com efeito de estufa. Desenvolver uma estratégia eficaz de Mitigação.

Que políticas podem ser implementadas para inverter este processo?
As duas linhas de acção fundamentais têm de ser, como acabei de referir: Mitigação e Adaptação.
Mitigação, alterando comportamentos e actuando sobre as causas das alterações climáticas, tentando reduzir a probabilidade dos acontecimentos que ainda podem ser evitaveis. As duas grandes estratégias de mitigação que o Relatório de Desenvolvimento Humano 2007/2008 propõe são: definir um orçamento de carbono, limitando as emissões de gases com efeito de estufa; e implementar esse orçamento, aumentando a eficiencia no uso de energia e promovendo tecnologias de reduzidas emissões de carbono.
A definição de um orcamento de carbono deverá começar por ser global, no ambito de um acordo internacional que substitua o actual Protocolo de Quioto após 2012. Contudo, esse compromisso internacional só poderá ser efectivado se, nacionalmente, cada país assumir metas e objectivos concretos. No Relatório propomos uma trajectória sustentável de emissões para o mundo: atingir um máximo de emissões em 2020 (20% acima dos níveis de 1990), e redução de emissões na ordem dos 50% em 2050 (também comparativamente a 1990). Esta trajectória tornará possível, e apenas possível (50% probabilidade), evitar um aumento de temperatura média global de 2C.
A situação actual nao é muito animadora. Se continuarmos a emitir ao nivel actual, o “orçamento” sustentável de carbono para todo o século XXI gastar-se-á entre 2032-2042. Torna-se então urgente mudar, principalmente a forma e o tipo de energia que usamos. Neste sentido, o Relatório também propõe alternativas que passam por: incentivos de mercado para essa mudança (atribuir um preço ao carbono, quer através de uma taxa às emissões, quer promovendo sistemas de limite-e-negociação para as mesmas); encorajar e acelerar essa mudanca de comportamentos através de políticas públicas ao nível de regulação de padrões de qualidade na construção, em aparelhos eléctricos e de iluminação, nos padrões de emissões de veículos, na promoção de energias renováveis, no incentivo à investigação e desenvolvimento de tecnologias de reduzidas emissões.
A segunda linha de acção deverá ser a de preparar populações para as alterações climáticas que já sejam inevitáveis. Para tal há que investir em infra-estruturas mais adequadas e resistentes ao clima (defesas contra cheias, inundações, ou reservas de água para períodos de seca), e investir na capacitação de pessoas para que sejam capazes de enfrentar riscos climáticos sem que sofram reveses profundos de desenvolvimento. Em termos de estratégias que já estão a ser desenvolvidas, é particularmente preocupante os poucos recursos e capacidades dos países em desenvolvimento para se adaptarem.
Ambas as linhas de acção, mitigação e adaptação, deverão ser apoiadas por cooperação internacional. Solidariedade e coordenação internacional, com partilha de conhecimentos e tecnologias, e com financimento são peças fundamentais para que os desafios climático e de desenvolvimento se possam vencer simultaneamente.

Em que medida este efeito irá afectar as populações mais desfavorecidas?
As alterações climáticas são uma ameaça futura à escala mundial, mas também e mais urgentemente aos que já hoje vivem em piores situações de desenvolvimento, aos mais pobres. Porque em geral vivem em áreas ecologicamente frágeis (em zonas com grande probabilidade de secas, em zonas costeiras onde o aumento do nível do mar pode ser catastrófico, em bairos urbanos degradados), porque em geral estão bastante dependentes da agricultura como forma de subsistencia, porque ainda são confrontados com graves situações de doença (como SIDA), são as populações hoje mais desfavorecidas que têm menor capacidade de gerir acrescidos problemas derivados de desastres climáticos. Como consequência da vulnerável situação em que vivem actualmente, para estas populações as alterações climáticas podem significar irreversíveis perdas de bem-estar ao nível de saúde, recursos económicos e sociais de subsistencia.
São as populações hoje mais desfavorecidas que sofrerão os primeiros e maiores efeitos negativos das alterações climáticas.

Como se podem preparar as populações para este futuro?
Em termos de adaptação, o Relatório apresenta propostas concretas a nível nacional e internacional.
Ao nível nacional, pede-se especial atenção a quatro grandes áreas: informação e planeamento de riscos climáticos, infra-estruturas, sistemas de seguro e protecção social, e instituições de gestão de desastres climáticos.
Ao nível internacional, reconhece-se que já existem mecanismos e instituições para a indispensável cooperação, mas urge-se para uma acção maior, mais rápida e mais coesa.

Qual a diferença entre Portugal se encontrar em 28º ou 29º lugar no Relatório de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas?
As entidades internacionais que nos fornecem os dados para calcularmos os diversos indicadores estatísticos incluem actualizações e alterações metodológicas. Assim sendo, a comparação dos valores do Indice de Desenvolvimento Humano (assim como das restantes estatísticas) deve ser realizada com cuidado, pois pode comportar uma variação real (a situação pode ser diferente em termos efectivos) e uma variação aparente (os numeros mudam apenas devido às referidas alterações metodológicas).
Antes de falar de Portugal, é também de salientar que os dados se referem sempre a 2 anos anteriores à edicto do Relatório. Ou seja, este ano de 2007, temos estatisticas de 2005. No ano passado, 2006, os dados referiam-se a 2004.
No caso de Portugal, no Relatório de Desenvolvimento Humano de 2007/2008, e usando os dados mais recentes, o nosso país surge na posição 29 (em 177 países e regiões), e com um valor de Indice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 0.897.
No Relatório de Desenvolvimento Humano de 2006, tinhamos um valor de 0.904 para o IDH e ocupávamos a posição 28. Este valor apresentado no ano passado baseou-se nos dados que tinhamos disponíveis nesse momento. Porém, se usarmos as séries de dados temporais mais actualizadas, o valor que deveria ter sido publicado no ano passado para Portugal deveria ter sido de 0.896, e a nossa posição relativa deveria também ter sido a mesma deste ano, 29.
Em termos efectivos, nao mudámos no ranking mundial, e aumentámos muito ligeiramente o nosso IDH (em 0.001). Significa então que, em termos de IDH, a situação de Portugal em 2004 e 2005 foi semelhante.

Biografia
Especialista do Programa das  Nações Unidas para o Desenvolvimento

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