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#01 | 26 Fevereiro 2007
         
 



António Costa Silva
“É crucial para a Europa a diversificação das fontes de abastecimento e a construção de um modelo energético mais seguro”
(1ª parte)

 

Qual é o peso da eficiência no actual paradigma energético?
O peso da eficiência no actual paradigma energético é ainda pouco significativo. Desde o primeiro choque petrolífero em 1973 que se fala na necessidade de aumentar a eficiência energética mas assim que o preço do petróleo voltou a descer as apostas então feitas nas energias renováveis e na eficiência voltaram praticamente ao grau zero.
O que subsistiu dessa época e influenciou o paradigma energético foi a política do Presidente Nixon de criar e definir “standards” para a indústria automóvel exigindo padrões de maior eficiência na utilização dos combustíveis. Essa é a base da “CAFE” – “Corporate Average Fuel Efficiency” - que regula a actividade do sector automóvel nos EUA e contribuiu para melhorar a eficiência no uso dos combustíveis. Dessa forma um automóvel utiliza hoje cerca de metade do combustível que utilizava na década de 1970 para percorrer a mesma distância. Mas o grande problema é que apesar da crise energética actual a “CAFE” não foi melhorada, há muitos anos que os “standards” para os automóveis nos EUA não são alterados e há uma resistência dos políticos em falar claro aos consumidores e dizer-lhes que têm de mudar os seus hábitos.
No que diz respeito à Europa e a Portugal de vez em quando volta em força a retórica da “eficiência energética” mas com magros resultados. Portugal tem uma factura energética que em 2006 chegou aos 6.5 mil milhões de Euros revelando um crescimento astronómico nos últimos anos. Se for implementado um programa sério de eficiência energética que mobilize o país podemos reduzir a nossa factura energética em cerca de 20% , aplicando medidas que visem a racionalização do uso da energia, a luta contra o desperdício, a utilização de lâmpadas fluorescentes e não incandescentes, a melhor gestão dos edifícios que são cerca de 3.5 milhões em Portugal, a utilização de equipamentos domésticos que tenham um desempenho energético mais eficaz. Mas o que se passa é que muitas vezes estas medidas não passam do papel.
Então o que é que é necessário fazer?
- Assumir publicamente as metas e os objectivos a alcançar;
- Mobilizar os cidadãos porque sem eles não se consegue materializar nenhum programa;
- Criar um sistema de monitorização para avaliar o impacto prático das medidas e ajustá-las às necessidades;
- Orientar os programas e adaptá-los aos diferentes sectores da economia sem esquecer a acção das famílias e dos consumidores domésticos, que é vital;
- Criar publicidade apelativa e orientá-la para os diferentes alvos nos canais de comunicação social.
O programa recente lançado pela ERSE com a colaboração de empresas como a EDP e a ENDESA pode ser um ponto de partida mas é preciso persistência, tenacidade e mobilização dos cidadãos.

Quais os principais desafios ao cumprimento da directiva para as energias renováveis?
Portugal nos últimos anos tem feito avanços importantes na área das energias renováveis. O caso da energia eólica é paradigmático e hoje Portugal é um país que está no pelotão da frente na utilização desta energia na Europa.
Mas isto é ainda pouco: é preciso fazer o mesmo na utilização da energia solar, quer a fotovoltaica para a produção de electricidade, quer a térmica para o aquecimento da água. Com as condições que Portugal tem é inadmissível que continue muito atrás da Alemanha e Áustria, países que não têm as condições óptimas de exposição solar de Portugal. O mesmo se passa relativamente à energia das ondas embora Portugal tenha já lançado um grande projecto como o que existe ao largo da Póvoa do Varzim. Também nada de significativo está feito ao nível da Biomassa e, tendo em conta que o país tem mais de 35% do seu solo coberto por floresta, é muito importante que a utilização da Biomassa não seja descurada. Nós vivemos numa sociedade que transforma recursos em lixo a um ritmo frenético e isto não é sustentável para o futuro. Temos de inverter a tendência e há que aproveitar os detritos da agricultura e das florestas e os resíduos urbanos para transformar lixo em recursos. Por isso um programa nacional para a Biomassa que crie condições para disseminar projectos vencedores, capazes de animar a vida económica no interior do país, criar emprego, fixar as populações e contribuir para um balanço energético mais saudável, é imperativo.
Os principais desafios a vencer são económicos e relacionam-se com o custo de produção de algumas destas energias, a necessidade de as tornar competitivas depois de uma fase inicial de apoio (o processo de “feed-in”), a integração na rede de distribuição existente, a receptividade dos “players” tradicionais e do mercado em geral, a assumpção da sua importância estratégica por parte dos poderes públicos pois a diversificação das fontes de energia e a aposta nos recursos endógenos é um meio importante para aumentar a segurança energética e diminuir a dependência do exterior. É também importante simplificar a atribuição das licenças, aumentar a operacionalidade e a capacidade de resposta dos poderes públicos e evitar as monstruosidades burocráticas que continuam em Portugal a asfixiar muitos projectos interessantes.

Qual é o interesse estratégico de Sines no futuro das reservas de gás natural?
Sines tem grande interesse estratégico para Portugal e também para a Europa. Em 1º lugar significa uma opção diferente para recepcionar gás para o país através da via marítima o que diminui a vulnerabilidade do país ao nível do abastecimento pois diminui a dependência relativamente ao pipeline da Argélia e do Magrebe. Hoje em dia um país será tanto mais independente do ponto de vista energético quanto mais alternativas de abastecimento possua e que estejam aptas a funcionar para colmatar possíveis rupturas que ocorram. Não podemos esquecer que a Argélia é um fornecedor fiável mas é um país que tem alguma instabilidade política interna que se arrasta desde que a FIS (“Frente Islâmica de Salvação”) ganhou as eleições e a seguir houve uma intervenção militar que impediu a sua efectiva tomada do poder no país. Portanto esta é uma espécie de espada de Dâmocles que pende sobre a rede de pipelines do Magrebe que é crucial para o abastecimento à Europa do Sul.
Em 2º lugar Sines e a costa portuguesa podem oferecer à Europa alternativas para esta aumentar a sua segurança energética face ao comportamento da Rússia que desde o início de 2006 revelou, com a crise do corte de gás à Ucrânia e em 2007 com o corte do abastecimento de petróleo à Bielorússia, uma propensão para utilizar a energia como arma geopolítica, o que inquieta toda a Europa. Não podemos esquecer que hoje a Europa importa 25% do seu gás da Rússia, 60% do Mar do Norte, 10% da Argélia e 3% da Nigéria. Mas com o declínio da produção no Mar do Norte, a tendência é para daqui a 20 anos o gás russo ocupar cerca de 70% do portfolio de importações da Europa.
Se nada se fizer a Europa pode ficar refém da Rússia e num ponto nevrálgico do seu modelo energético. No início de 2006 quando a Rússia cortou o fornecimento de gás, à Ucrânia, a Alemanha, a França, a Itália, a Hungria, a Áustria e outros países europeus foram fortemente afectados com reduções de gás que variaram entre 30 a 80%. Quer dizer: é crucial para a Europa a diversificação das fontes de abastecimento e a construção de um modelo energético mais seguro onde a Rússia será sempre um parceiro a ter em conta mas que não deve ser dominante. Sines e outros terminais de LNG (“gás natural liquefeito”) que se construam na costa portuguesa podem ser sempre alternativas para importar gás da Nigéria, de Trinidade e Tobago, da Guiné Equatorial e de outros países da Bacia Atlântica. De facto, Sines pode ser uma plataforma importante na génese de um eixo do gás na Bacia Atlântica que compense a Europa das suas fragilidades actuais.
Em 3º lugar Sines é importante à luz de um facto que pode ocorrer a partir de 2011 e que é a possibilidade de a Europa, se nada fizer até então, ser confrontada com uma falta de gás que pode chegar aos 70 mil milhões de metros cúbicos por ano. Isto é equivalente ao consumo actual da Espanha e da França. A falta de gás deve-se ao facto de muitos países europeus estarem a apostar em centrais a gás sem assegurarem que vai haver gás suficiente. Com os contratos actuais e as instalações existentes na Europa não vai ser possível satisfazer todas as necessidades. Acresce a isso o facto de os 3 maiores produtores de gás do mundo e que têm também as maiores reservas, estarem em situação difícil para assegurar os níveis crescentes de abastecimento.
A Rússia não tem investido no “Upstream” na busca de novas reservas de gás e o seu sistema de gasodutos e pipelines está a ficar obsoleto. O investimento na Rússia está 25% abaixo do necessário para enfrentar as necessidades futuras. O Irão, que com a Rússia domina 50% das reservas mundiais de gás, está paralisado com o efeito das sanções americanas e não há projectos novos e significativos. O Qatar decidiu fazer uma pausa e está a analisar o potencial do seu campo “North Field” antes de decidir, dentro de 2 a 3 anos, se vai embarcar em novos projectos. Resultado: a Europa, para evitar uma crise de fornecimento de gás no início da próxima década, tem de construir entre 10 a 12 novos terminais de LNG e a costa portuguesa é uma excelente plataforma para se candidatar a alguns desses terminais que são cruciais para o futuro da Europa e para a sua segurança energética.

Biografia
Presidente do Conselho de Administração do grupo Partex Oil and Gas

Qualificação Académica:
Agregação em Planeamento e Gestão Integrada de Recursos Energéticos, 2002, Instituto Superior Técnico
PhD em «Development of stochastic models applied to petroleum reservoirs»,1993, Technical University of Lisbon/London Imperial College
Assigned Member of the Imperial College of Science and Technology, London University, 1984
Mestrado em Petroleum Engeneering, 1984, Imperial College of Science and Technology, London University
Licenciatura em Engenharia de Minas, 1983, Instituto Superior Técnico

Principais Áreas Científicas de Investigação:
Caracterização de reservatórios e modelização integrando geologia e geofísica
Simulação dinâmica de modelos
Caracterização matemática e estocástica de reservatórios de fluídos
Gestão de reservatórios e desenho de planos de desenvolvimento

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