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#91 | 23 Julho 2007
   
         
 



Fátima Cardoso
“Interrogar os genes é como obter o cartão de identidade do tumor”

 

Quais são os alicerces do cancro?
As células tumorais não são células estranhas ao nosso organismo mas sim células normais que adquiriram certas características que lhes conferem certas capacidades especiais; estas características permitem-lhes escapar ao nosso sistema imunitário e ao mesmo tempo escapar ao sistemas de controlo do crescimento. Assim, o cancro desenvolve-se quando as células adquirem a capacidade de se dividir sem controlo (Proliferação), de invadir os tecidos vizinhos (Invasão), de invadir a circulação (sanguínea ou linfática) formando metástases à distância (Metastização), de formar novos vasos sanguíneos para se alimentar (Angiogenése), e de escapar ao sistema imunitário (Escape imunológico).

Em que consiste a “terapêutica oncológica por medida”?
Consiste em determinar qual o melhor tratamento para cada doente individualmente. Até há pouco tempo, os avanços em Oncologia (e na Medicina em geral) faziam-se através de ensaios clínicos que comparavam o tratamento A (o standard) com o tratamento B (o novo); quando o estudo era positivo, isto é, mostrava que o tratamento B era globalmente melhor que o A, o B passava a ser o tratamento standard para todos os doentes com esse tipo de cancro. No entanto, esse melhor resultado globalmente pode significar que a maioria dos doentes beneficia mas não todos; nalguns o tratamento A pode mesmo ser o melhor. Assim, a extrapolação de resultados obtidos numa população para um individuo pode levar a erros.
Com o melhor conhecimento da biologia do cancro, sabe-se que por exemplo o cancro da mama não é uma só doença mas sim várias doenças com evoluções muito diferentes; esta divisão é baseada em características biológicas como os receptores hormonais, o receptor HER-2, o índice de proliferação, etc. Assim cada vez mais os estudos serão desenvolvidos em subgrupos de doentes (ou subtipos do cancro da mama) e não em toda a população indiscriminadamente.
As duas perguntas mais importantes neste momento a responder para os doentes com cancro da mama precoce são: Quem precisa de quimioterapia? Qual a melhor quimioterapia para a doente individualmente?

O que é um “chip de ADN”?
É uma tecnologia que permite interrogar milhares de genes do tumor simultaneamente. Não são os genes da pessoa (não estamos a falar aqui de cancro hereditário) mas sim os genes do tumor, também chamada genómica em oposição à genética (genes da pessoa).
Ao interrogar os genes a sua expressão é comparada com um valor conhecido e podemos saber quais os genes que estão activados e os que não o estão ou estão mesmo inibidos. No global é como obter o cartão de identidade do tumor, a sua impressão digital.

Que inovações foram introduzidas pelo Transbig no processo de colaboração entre cientistas e clínicos?
A chamada investigação translacional ou de transferência é a investigação que aplica à clinica as descobertas feitas no laboratório para o beneficio dos doentes. Para que este tipo de investigação possa ter sucesso é necessária uma intensa colaboração entre cientistas  e clínicos. No entanto, na maioria das vezes estes 2 tipos de pessoas vivem em “mundos diferentes” e falam “linguagens diferentes”. TRANSBIG conseguiu estimular a colaboração entre alguns dos melhores cientistas europeus com alguns dos melhores investigadores clínicos europeus.
Para além disso, outra barreira frequente para a aplicação clínica correcta e rápida das descobertas científicas é o facto da maioria dos estudos feitos serem demasiado pequenos e assim não permitirem a obtenção de resultados definitivos. TRANSBIG permitiu que várias equipas europeias juntassem os seus esforços na Europa, unindo-se num mesmo projecto, o que permitirá que o estudo MINDACT, que incluirá 6000 doentes, seja realizado em mais ou menos 3 anos.
Este estudo é o primeiro no mundo a trazer para a investigação clinica, e posteriormente, se validado, para a prática clinica, a tecnologia dos “microarray”  ou da genómica.

Quais os aspectos legais, éticos e financeiros do seu desafio?
Este projecto, tal como muitos que são feitos nesta área, levanta vários problemas/questões/desafios que não são possíveis de resumir numa resposta curta. Alguns exemplos são:
a) a quem pertencem os tumores? às doentes, ao Hospital?
b) pode a doente doar uma parte do seu tumor para a investigação?
c) a quem pertencem os direitos sobre o teste genómico uma vez aprovado e comercialmente disponível?
d) como ultrapassar as dificuldades impostas pelas diferentes aplicações da Directiva Europeia sobre Ensaios Clínicos, que foram feitas nos diferentes países da UE?
e) quem deve pagar este tipo de investigação? (A Comissão Europeia seleccionou o TRANSBIG como um dos projectos para o qual um “grant” de 7 milhões de euros foi atribuído; no entanto, o custo total do estudo são 35 milhões de euros...Se a hipótese testada no MINDACT estiver correcta, cerca de 10 a 20% menos doentes receberão quimioterapia no futuro, o que representa não só um grande beneficio para as doentes mas também para a sociedade pois as despesas poupadas serão muito superiores ao custo do estudo...isto é, seria um bom investimentos dos governos dos diferentes países...)

Biografia
Professora Assistente na Clínica de Oncologia Médica Jules Bordet Institute, em Bruxelas, Bélgica.
Membro activo do Translational Research Unit e Directora Científica da rede TRANSBIG.
Os seus interesses de investigação incluem a biologia do cancro da mama, marcadores preditivos da resposta a terapias sistémicas e novos medicamentos oncológicos.

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