CASO NÃO CONSIGA VISUALIZAR CORRECTAMENTE ESTA NEWSLETTER CLIQUE AQUI
 
#09| 27 Setembro 05
 

Licenciado em Engenharia Electrotécnica pelo Instituto Superior Técnico (IST) em 1994 e actualmente a concluir o Mestrado na mesma escola. Foi convidado em 1994 para se juntar ao grupo do IST que então liderava o projecto europeu do primeiro veículo submarino autónomo civil europeu – o MARIUS, posição que mantém até hoje. Tem participado em variados projectos nacionais e internacionais do IST e desde 1998 a 2004 participou em todas as missões anuais do IST nos Açores em colaboração com o Departamento de Oceanografia e Pescas da Universidade dos Açores. Desde 1994 tem-se dedicado ao projecto electromecânico de variados componentes dos robots oceânicos do IST. Estas actividades vão desde a concepção usando ferramentas de CAD 3D e simulação de sistemas dinâmicos, até à coordenação da manufactura e montagem das peças, e ainda a coordenação de diversos testes dos subsistemas no mar antes de serem instalados nos veículos. No âmbito do projecto MEDIRES tem vindo a desenvolver algoritmos e software para processamento de dados de sonar e integração com SIG (Sistemas de Informação Geográfica). As suas áreas de interesse incluem Sistemas Dinâmicos, Robótica, Navegação, Controlo, Projecto Mecânico, Operações no mar, Imagem sonar e SIG.

email
site
Luís Sebastião
“Nunca é tarde demais.”

Quais os novos conceitos teóricos que derivam da simbiose entre a ciência marinha e a tecnologia marinha?
Muitos certamente! Vou falar apenas de dois. No campo da Biologia, as explorações recentes das fontes hidrotermais de grande profundidade (o equivalente subaquático das "fumarolas") vieram revolucionar as teorias sobre a origem da vida! As tecnologias e alguma dose de sorte levaram os cientistas a lugares como o "Lucky Strike" onde se descobriu que existem formas de vida que são totalmente independentes da fotossíntese! Todos os seres vivos que nos rodeiam fora de água (e dentro de água até profundidades reduzidas) podem ser organizados numa cadeia alimentar cujas espécies de suporte dependem da fotossíntese. Mas nas profundezas (800-1000 metros ou mais) descobriram-se comunidades de moluscos e uns "primos" dos camarões que vivem sem qualquer dependência da luz e na presença de produtos altamente tóxicos! Esta cadeia alimentar tem por fonte de energia os produtos químicos emanados pelas fontes hidrotermais, daí que se diga que realizam a quimiossíntese. Esta recente descoberta criou uma revolução nas teorias de origem da vida no planeta terra: numa altura em que a atmosfera ainda filtrava fortemente a luz do sol, já havia condições para haver vida no mar profundo e pode daí ter sido trazida para fora de água. Fascinante, não é?
O segundo exemplo que vou dar, e porque se trata mesmo de uma simbiose, é sobre a tecnologia marinha. Explorar, cada vez mais fundo e em áreas cada vez maiores é um desafio tremendo. Duas coisas são particularmente difíceis: as comunicações e a navegação (no sentido de determinar a posição de um veículo ou de um objecto debaixo de água). Recordo-me de uma apresentação da Dra. Marcia McNutt, Directora do Monterey Bay Research Institute (http://www.mbari.org), cuja introdução focava as explorações do nosso Fernão de Magalhães e durante a qual ela se questionou "O que diria ele se voltasse 500 anos depois e verificasse que nós ainda nos debatemos com o mesmo problema que ele se debatia - a navegação?". Claro que isto se refere, no tempo presente, à navegação debaixo de água. Neste contexto têm surgido soluções muito interessantes que envolvem a colaboração de veículos autónomos de superfície e submarinos. Efectivamente, tal como proposto no projecto ASIMOV (http://dsor.isr.ist.utl.pt/Projects/Asimov/index.html), um veículo de superfície que se mantenha na vertical sobre um veículo submarino ajuda à determinação da posição do submarino e facilita grandemente as comunicações por canal acústico entre os dois. Esta operação conjunta põe uma série de problemas práticos mas também teóricos: o estudo do controlo coordenado de veículos autónomos é tópico muito actual de investigação, já foi o cerne de algumas teses de doutoramento e ainda há muito para fazer incluindo demonstrações experimentais dos conceitos!

O que é que amanhã será tarde demais?
Tudo. E nada. Até sou apologista do "nunca é tarde demais"! ;-) Pode parecer contraditório mas para mim não é.
Na verdade esta expressão ficou registada no meu diário de bordo quando vi o filme "Clube dos Poetas Mortos". A rebeldia, o espírito crítico, a criatividade, liberdade para explorar e outras irreverências que estavam associadas a este filme agradaram-me bastante e adoptei o mote "Carpe diem".
No sentido mais estrito da expressão pode-se aplicar desde coisas triviais como decidir dar um mergulho fantástico às 8h da noite, estando a 300km de casa, até às mais sérias se pensarmos que amanhã a morte pode bater-nos à porta. Não quero chocar ninguém mas é mesmo assim. Que o diga o Steve Jobs, CEO da Apple Computer e da Pixar Animation Studios (recomendo vivamente a leitura de
http://news-service.stanford.edu/news/2005/june15/jobs-061505.html.

A curiosidade, é uma doença?
Não diria, acho que é mais uma questão de feitio e/ou de atitude. É o motor que está na génese de muitas descobertas. Acho que está muito associado a outra "doença" que é o espírito crítico. Dá tanto gozo quando perante uma determinada questão há algo que parece não bater certo, despertando a curiosidade sobre outras formas de resolver o problema que acaba por levar-nos a soluções interessantes. A vida deve mesmo ser muito aborrecida se se perder a curiosidade e o espírito crítico!

A Natureza, pode revoltar-se?
O minha formação leva-me a encarar a Natureza como um grande sistema dinâmico, com uma dimensão formidável de processos (físicos, químicos e outros) e onde, para ajudar à festa, há uns seres que dão um grande contributo para abalar os delicados equilíbrios desse sistema. Assim, sou levado a achar que não, não se trata de a Natureza revoltar-se. Há situações em que os fenómenos podem parecer uma autêntica revolta da Natureza reagindo contra quem tenta dominá-la, o que aliás é bom porque contribui para que esse ser dominador repense a sua intervenção! Se a Natureza pudesse mesmo revoltar-se já teria erradicado uns quantos senhores deste planeta!

O que fixa no horizonte?
A linha do horizonte do oceano, vista de um veleiro onde navego. Nesse veleiro há uma pequena sala com variados écrans onde fervilham dados e fluem imagens recebidas de lugares subaquáticos. Os veículos robóticos estão permanentemente a trabalhar mapeando zonas desconhecidas, monitorizando áreas sensíveis como sejam as áreas protegidas para o desenvolvimento dos peixes - autenticas maternidades e creches subaquáticas. Áreas essas que já há muito foram definidas com a ajuda do mesmo tipo de veículos!
Outros veículos mapeiam meticulosamente os destroços de uma nau portuguesa afundada no século XVII à chegada da Índia. Foi uma luta tremenda com os piratas que, incapazes de tomá-la, optaram por a incendiar e assim afundar. Podemos ver os destroços mergulhando não no oceano mas num ambiente virtual recriado por um computador com base nos dados recolhidos pelos robots submarinos e assim conservando o património cultural para as gerações vindouras!
E agora... que está tudo a correr bem com as missões em curso, é altura de fundear e dar um mergulhinho!

 
 

Anteriores entrevistas:
Helder Coelho
José Tribolet
José Félix Costa
Luís Cabral
Maria Margarida Souto-Carneiro
Henrique Garcia Pereira
António Pedro Dores
Jorge Buescu

 
Editor
António Coxito
Produção
Ricardo Melo
Design
Luís Silva
Subscrições/cancelamento
Esta mensagem está de acordo com a legislação Europeia sobre o envio de mensagens comerciais: qualquer mensagem deverá estar claramente identificada com os dados do emissor e deverá proporcionar ao receptor a hipótese de ser removido da lista. Para ser removido da nossa lista, basta que nos responda a esta mensagem colocando a palavra "Remover" no assunto. (Directiva 2000/31/CE do Parlamento Europeu; Relatório A5-270/2001 do Parlamento Europeu)