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#82 | 19 Fevereiro 2007
   
         
 



Benilde Costa
“Há certas leis e costumes neste Império que são muito peculiares“

 

Em que consiste a mecanossíntese?
A mecanossíntese, um processo de moagem a alta energia e a seco, é um método de síntese de materiais, frequentemente com estruturas de não equilíbrio: soluções sólidas extendidas, ligas formadas a partir de elementos não miscíveis, fases amorfas, todo o tipo de compostos e compósitos. Os pós elementares com a finalidade de serem misturados são introduzidos nas proporções adequadas em taças com bolas geralmente feitas de aço endurecido. A taça é geralmente selada em atmosfera neutra ou em vazio, sendo então vigorosamente agitada num moinho de alta energia para produzir colisões entre as bolas ou entre a taça e bolas com velocidades de impacto da ordem de alguns m/s e frequências de choque de cerca de alguns Hz. O processo continuado de fractura e soldadura das partículas “apanhadas”durante as colisões faz com que a matéria seja permanentemente modificada entre ela. Os pós evoluem progressivamente até um estado estacionário. Os pós de liga final consistem geralmente em partículas nanoestruturadas.
A mecanossíntese da mistura de pós de elementos puros ou de pós de elementos já parcialmente combinados, deve ser distinguida da moagem de materiais cuja composição química permanece a mesma durante a moagem mas cuja estrutura ou “microestrutura” se modifica. A moagem é uma forma de induzir transformações de fase em sólidos: amorfização ou transformações polimórficas de compostos, desordem em ligas ordenadas são exemplos entre outros.

Que vantagens apresentam as ligas por si estudadas?
Em Liliput, Guliver notou que ”há certas leis e costumes neste Império que são muito peculiares”, uma observação que se pode aplicar também a materiais nanoestruturados. Estes materiais têm de facto comportamentos diferentes quando comparados com os correspondentes materiais macroscópicos porque os tamanhos característicos são mais pequenos que a escala caracteristica dos fenómenos físicos que ocorrem nos materiais convencionais. Nos materiais nanoestruturados (consolidados ou em pó) o tamanho das partículas é grande quando comparado com o tamanho médio das cristalites que é menor que 100 nm. Materiais cujas cristalites variam entre 100 nm e 1 ?m são geralmente chamados materiais de grão ultrafino. Os materiais convencionais têm grãos de vários micrómetros. Assim, para um mesmo volume de amostra, os materiais nanoestruturados têm mais fronteiras e grão que os convencionais.
No caso de ligas FeCr e FeV em que a nucleação de fases causadoras de degradação de propriedades mecânicas, fragilidade e resistência à corrosão se dá nas fronteiras de grão, os materiais nanoestruturados apresentam desvantagens em relação aos convencionais, uma vez que há mais centros de nucleação dessas fases e consequentemente as transformações são mais rápidas.

Que contributos trás o seu estudo para a investigação académica?
Os materiais nanoestruturados têm grande interesse tanto científico como tecnológico devido às suas propriedades físicas serem em geral diferentes das dos materiais convencionais policristalinos e também devido às suas aplicações já implementadas e potenciais.
Os sistemas Fe-Cr e Fe-V são talvez o melhor exemplo do uso da mecanossíntese no fabrico do estado amorfo, uma vez que esta é uma das três vias - as outras são a evaporação com taxa de deposição muito lenta e a produção de filmes finos camada a camada – para atingir tal estado nos citados sistemas.
Um dos métodos experimentais que tem provado ser útil neste tipo de estudos é a espectroscopia de Mössbauer graças à alta sensibilidade dos parâmetros hiperfinos em relação ao número de coordenação e campo cristalino. Assim, os estados desordenados (amorfos) podem distinguir-se dos ordenados (cristalinos), sendo isto especialmente importante no caso de sistemas nanocristalinos em que os métodos de difracção de raios-X falham quando se quer distinguir sem ambiguidade entre fases amorfas, nano-cristalinas ou fases separadas ricas em Fe e ricas em Cr (isto no caso do sistema Fe-Cr).
Para além do estudo de amorfos, também o estudo da cinética de precipitação de fases nestas ligas e de fases metaestáveis (que não aparecem nos diagramas de fase ) se revelam bastante importantes.
O estudo de propriedades dinâmicas, magnéticas e estruturais destes sistemas tem contribuído de modo significativo para o melhor conhecimento destes materiais.

Considera que, nas instalações industriais, são suficientemente acauteladas as deficiências dos materiais e as consequentes catástrofes ecológicas?
Em aplicações industriais há que ter em conta o envelhecimento dos materiais que leva à deterioração das propriedades mecânicas e os fragilizam. Assim, periodicamente a manutenção deve ser feita no sentido da substituição dos materiais.

Que fases da investigação prefere desenvolver individualmente e em colaboração?
O trabalho em colaboração tanto nacional como internacional é muito importante, não só porque cada vez mais se usam várias técnicas para estudar os materiais que não estão todas disponíveis no mesmo laboratório, bem como a discussão científica entre pessoas ou grupos com os mesmos interesses permite encontrar respostas adequadas aos resultados obtidos nos estudos efectuados.
É necessário recorrer à colaboração com outros laboratórios sempre que técnicas de que não disponho se mostram necessárias à investigação proposta. Por outro lado, com as técnicas que possuo, também tento dar resposta a pedidos de outros colegas no sentido de clarificar resultados por eles obtidos por outras vias experimentais.

Biografia
Professora auxiliar no Departamento de Física da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, no grupo de Física Nuclear da Matéria Condensada.
Tem vários artigos publicados em revistas internacionais com sistema de arbitragem e recebeu um prémio de mérito da Academia Górniczo-Hutnicza da Polónia pelo seu trabalho desenvolvido em 2005.

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