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#17| 21 Novembro 05
 

Nasceu em Lisboa em 1968. Licenciou-se em Engenharia Metalúrgica e de Materiais em 1990 no Instituto Superior Técnico. Foi mãe em 1994. Obteve o grau de doutor em Física Aplicada pela Universidade de Groningen (Holanda) em 2001. Actualmente é docente no Instituto Superior Técnico. As suas áreas de interesse científico centram-se na caracterização de defeitos cristalinos e determinação de estruturas, bem como na visualização e caracterização de domínios magnéticos.

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Patrícia Almeida Carvalho
“Imagine-se um mundo sem banheiras nem trompetes.”

Quais os últimos progressos feitos na circumnavegação da verdade?
A circumnavegação da verdade é uma arte que atingiu recentemente o seu auge no discurso político Português. Neste momento, como a realidade nos aparece incontornável e já não há contorcionismos políticos que nos consigam surpreender, podemos inferir que esta corrente artística entrou, senão em decadência, pelo menos num período de estagnação. De facto, tornou-se evidente que só uma definição séria de estratégias de desenvolvimento económico e social poderá substituir a liderança decadente que temos tido. Parece haver um reflexo desta evidência na performance dramática do governo actual...

Quais as qualidades dos defeitos?
Os defeitos devem ser entendidos como desvios à perfeição imaginada; compreender a sua origem ajuda-nos a aprofundar o conhecimento da natureza. Uma das áreas mais interessantes em Ciência dos Materiais é a análise de defeitos cristalinos. Se imaginarmos uma liga constituída por átomos do tipo A e por átomos do tipo B, ao empilhamento organizado destes átomos poderemos chamar cristal. Uma estrutura cristalina perfeita poderia ser obtida, por exemplo, pelo empilhamento alternado de camadas de A e de B ad infinitum. No entanto, se por um qualquer motivo nalgum local do cristal existirem consecutivamente duas camadas do mesmo tipo, isto é, se a sua secção apresentar uma sequência do tipo: …ABABABBABABA…, teremos um defeito cristalino (região sublinhada) a que se chama falha de empilhamento. Este tipo de defeitos tem uma influência determinante na deformação permanente dos materiais, que se obtém fazendo escorregar planos de átomos uns sobre os outros. Sem defeitos cristalinos nenhuma chapa metálica seria passível de ser deformada por estampagem ou dobragem, e imagine-se um mundo sem banheiras nem trompetes. A optimização dos materiais em função da sua aplicação passa muitas vezes pela definição do tipo e número de defeitos favoráveis, indução da sua presença e selecção por forma a eliminar-se os que não propiciam propriedades interessantes.

O que há depois da beleza?
A beleza entendida como geradora de atracção física é íntima da juventude. Depois desta beleza há tudo o resto, mas a sua importância é indiscutível. Esta questão que costuma atormentar mais as mulheres do que os homens, é apresentada com clareza no livro “Sex differences, developmental and evolutionary strategies” de Linda Mealey (Academic Press). Os dados antropológicos dizem-nos que para as mulheres, e em média, a atracção física atinge o seu auge aos 22 anos, o que coincide com o pico de fertilidade. Recomendo a leitura deste livro a quem tem curiosidade em entender estas e outras verdades desconcertantes (tais como, a relação entre dimorfismo sexual e a poligamia/monogamia, a razão de na espécie humana as fêmeas viverem décadas depois da idade fértil, etc.).

Que medidas podiam ser tomadas para rentabilizar a investigação feita na sua área, em Portugal?
Infelizmente penso que nenhumas, e reiterando a infelicidade, tanto na minha área como em muitas outras. Penso que em geral o tecido industrial (que não pode ser dissociado da administração estatal envolvente) tem dado provas de não conseguir interessar-se pelos benefícios que a investigação científica lhe possa trazer. Também porque não tem podido preocupar-se senão com a sobrevivência a muito curto prazo. É evidente que há alguns casos de sucesso na cooperação e transferência de conhecimento entre instituições científicas e a indústria Portuguesa. Por outro lado, é importante salientar que a maior parte dos projectos de investigação desenvolvidos em Portugal envolve investimento e colaboração com indústria, só que não Portuguesa. Penso que a investigação feita em Portugal terá sempre uma rentabilização global, mas temo que a transferência de conhecimento científico para a indústria Portuguesa possa ser em muitas situações um mau investimento. É interessante reparar, por exemplo, que países como Inglaterra tenham vindo a deslocalizar a indústria para o leste Europeu, China e Índia, ao mesmo tempo que se desenvolvem na área financeira. Penso também que estas constatações não implicam necessariamente uma catástrofe para Portugal. Será sim necessário que se definam estratégias sérias de desenvolvimento que passem também pelo investimento no aproveitamento dos nossos recursos, tais como floresta, hospitalidade e recursos paisagísticos, energia solar e eólica, vinho, cortiça, queijo de ovelha. Há tanto a fazer. Por exemplo, a utilização de energia solar para aquecimento doméstico é hoje reconhecidamente eficaz para níveis de exposição equivalentes aos do Sul da Alemanha. Porque é então tão complicada e pouco eficiente a instalação de painéis solares nas casas portuguesas?

Até que ponto a segunda lei da termodinâmica ainda é aplicável?
A segunda lei da termodinâmica é uma lei de aplicação universal que basicamente declara que um aumento de ordem num determinado local de um sistema isolado (isto é um sistema que não troca matéria ou energia com o exterior) é sempre acompanhado por um aumento de desordem de tamanho igual ou superior noutro local desse sistema. É uma lei que tende a induzir uma certa angústia a quem costuma fazer a lida da casa e se preocupa com o exterior do seu ecossistema privado.

 

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